terça-feira, 1 de maio de 2012





Hoje estamos completando seis anos de caminhada...


Ainda que esteja havendo um “intervalo”, queremos abraçar com carinho a todos os que fazem parte do blog e do flickr e agradecer a participação e compreensão de todos ao longo desses anos...


01.05.2006 --------01.05.2012

segunda-feira, 30 de abril de 2012


Por motivos diversos, as postagens do “(Entre)laços do Coração” estão suspensas desde janeiro de 2012...



Visitem os blogs dos integrantes do grupo indicados na lateral à direita...


quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

MINHA NATUREZA


Bernadete Bruto
www.bernadetebruto.com



Numa praia

Pés na areia de um igarapé

Ou deslizando numa canoa

Ao sabor da corrente do rio

Facilmente

Sinto-me

Naturalmente

Como se estivesse em casa!


Obs: Imagens enviadas pela autora.
CRUZEIRO DO SUL/AC, 30 DE AGOSTO DE 2011


Epifania


cairo de assis trindade


ruas, rios, céus, e sóis...
tudo existe só
por mim, por ti pra nós.

...Você não sabe...


CauReb



Você não sabe
Quantas lágrimas
Derramei sozinha
Na escuridão do meu quarto...

Você não sabe
O quanto sua presença
Ao meu lado
Me fez falta...

Você não sabe
Quantas feridas
Carrego dentro de mim...

Não, você não sabe
O quanto suas duras palavras
Influenciaram a minha vida...

Não...
Você realmente não sabe...

21/06/2011


Obs: Imagem enviada pela autora.

UM TEMPO PARA GANHAR...


Célia Cavalcanti



É o momento da alegria que envolve vários sentimentos: a certeza que valeu cada esforço, cada recomeço, cada gota de suor derramado...A certeza que se é capaz...Que não estamos tão por baixo assim...A certeza que a vida não é só perder...Perde-se muito sim...Já nascemos perdendo, chorando, pois saímos do útero de nossa mãe. Para ganharmos a vida, perdemos o cordão umbilical...

O momento da vitória é importante, no entanto é preciso saber ganhar...Hoje sou o melhor, mas não o único. Amanhã talvez seja o momento de saber perder e assim continua a vida...Para tudo existe um momento, um tempo...


Obs: Imagem enviada pela autora.


MANIFESTO


Dade Amorim


          Acredito na poesia como uma experiência que não para de se renovar, e ao longo do tempo pode tornar as pessoas melhores. O exercício da poesia induz o autoconhecimento, sem o qual ninguém sai do lugar. Dá a medida e o peso do que é preciso saber, porque ilumina a razão com a experiência mais íntima das coisas e dos acontecimentos. Aliás, poesia é acontecimento.

          Poesia não serve para rimar palavras ou burilar frases de efeito. Ela relativiza as defesas que criamos para nos aprisionar; remove as máscaras com que tentamos nos esconder ou nos engrandecer. Desmistifica toda fantasia que não exista para celebrar, mas para enganar os outros e a nós mesmos. O exercício da poesia revela a inutilidade de nossos álibis. É o par de asas a nosso alcance.

          Acredito profundamente na poesia, porque aproxima estranhos e diferentes, semeia um conhecimento para o qual não existem currículos bastantes, desperta o corpo e a alma das pessoas para uma liberdade que nada pode destruir, porque consegue dizer o que nenhuma outra linguagem comunica. Um bom poema é o simulacro de um momento na vida de alguém, com sua grandeza e fragilidade.

          Acredito na força da poesia, capaz de revelar a beleza de uma fruta, um corpo ou uma guerra; uma paixão ou um canto de casa empoeirado, a lama da estrada, as nuvens de chumbo – melhor ainda se o arco-íris não aparecer.

          E porque não se impõe nem obriga a nada, acredito que a poesia é a expressão mais verdadeira da difícil liberdade humana.


ESCURO


Dannie Oliveira


Lá fora as folhas balançavam na velha mangueira. Ruidosas, estranhas, violentas, bravas. Escuro. Estendeu à mão a frente do rosto. Não a viu. Mexeu os dedos. Fez gestos obscenos. Feios para um menino da sua idade. Não adiantou. Tateou em vão pelo quarto. Engraçado como nestas situações tudo parece enorme. A cama havia sumido. Mas, quinze minutos antes das luzes se apagarem, quinze minutos antes do transformador no outro lado da rua explodir, quinze minutos antes dele entrar correndo atrás do controle do vídeo game, a cama estava lá! Tinha certeza disso. O joelho encontrou a mesinha. Barulho. O abajur caiu no chão. Com certeza a mãe ia matá-lo quando visse os pedaços. Sentiu algo correr no seu pé. Sangue! Carambas sangue! Era só o que faltava!

Agora provavelmente o tapete azul claro estava cheio de pegadas. Gritou pela mãe. Uma, duas, três vezes. Ela não respondeu. Vai ver também tateava pela casa em busca de uma vela. Gritou de novo. Nada. Gritou pelo irmão. Nada. Pelo pai. Nada. Pelo cachorro. Esse sim apareceu no quarto. Percebeu que ele estava ali quando sentiu algo lambendo o corte no dedão.

Era errado um garoto de 07 anos sentir medo? Ainda mais do escuro. De repente lembrou-se do monstro debaixo da cama. Ele estava lá. Sabia disso. Ouvia sua respiração ruidosa. Ouviu um barulho esquisito. Um cheiro esquisito. Unhas no chão de madeira. Ele estava saindo de lá. Estava vindo do seu mundo feio e sujo para pega-lo. Gritou pela mãe desesperado. Ela não respondeu. Chamou pelo cachorro. Droga! Cadê o Spike nessa hora?

Ele ia devorá-lo e depois ainda ia soltar um arroto daqueles, típico de um monstro. Viu quatro pontinhos no escuro. Ele tinha quatro olhos! Começou a gritar e gritar. Plaft! A voz sumiu. Pensou em correr no escuro, mas as pernas estavam paralisadas. Moveu os braços. Ainda estavam soltos. Pensou num rápido plano mirabolante. Pensou em pegar algum objeto. Pensou em desferir um murro forte, semelhante a um daqueles desferidos por aquele jogador do jogo de luta. Respirou fundo.

O monstro estava mais perto. Era agora! Sentiu o fedor. Como fedia o monstro! Ouviu algo arrastando no chão. Devia ser o rabo. Ele tinha um rabo grande pelo barulho que fazia. Porque a luz não voltava logo? Começou a chorar. Chorar. Chorar. Queria a mãe, o pai e até o chato do irmão ali com ele. Porque todo mundo tinha sumido? Será que ele não era um bom menino? Mas ele sempre ajudava os velhinhos a atravessar a rua. Juntava o lixo direitinho. Recolhia os pratos da mesa depois de comer. Não deixava a toalha em cima da cama. Os sapatos jogados pela casa. Porquê?porquê? Fechou os olhos. Não queria ver aquela cena, se bem que já estava tudo escuro mesmo ...

- Jorginho acorda filho. Acorda menino!

Abriu o olho direito. Depois o esquerdo.


Obs: Imagem enviada pela autora.


SOMBRAS MADURAS


Djanira Silva


          A janela é um toque de luz na casa flutuante na superfície da água. Não adianta mudar o foco de visão, o olho da janela, sempre no mesmo lugar, tem vida como o olho de uma fotografia ou as asas do vento batendo forte nas águas do mar.
          Círculo que se fecha em sucessivas ondas, braços prateados, coloridos, arco-íris restaurado no que resta do mundo.
          O olhar pendurado na janela. Mistério de imagens imersas, petrificadas numa parda que não me permite ver o essencial.
          Cheio ou vazio, o mundo é mistério. Difícil saber onde começa, onde termina.
          Algemada à saudade, nunca serei livre. Prendem-me as formas e as cores do perigo. Não posso ver o outro lado enquanto as sombras amadurecem, mudam de lugar e não refletem meu rosto nem a mão que me tortura. Formas indefinidas oscilam nas faces, nos olhos, no sorriso de uma superfície sem definição.
         Abre-se, cada vez mais, a janela. Não consigo fugir à hipnose do tempo. Tento ler as legendas do mundo, legendas que me falam de quem ri, de quem diz não. Círculos, sombras, formas geométricas, certezas.
          O vento fecha a janela, apaga a porta. Não tenho como fugir das imagens que amanhã voltarão, embora eu não saiba onde ficou o ontem, onde estará o amanhã.
          Rio, mar, cachoeiras. Apenas bolhas e espuma nos desfiladeiros. Na alma a agonia do invisível nas armadilhas dos sonhos.


Obs: Texto retirado do livro da autora – A Morte Cega

2011: QUEM PAGA A CONTA?


D. Demétrio Valentini *

          O ano de 2011 se retira de cena. Parece com pressa de passar adiante a tocha da história. Quer se ver livre de compromissos, que ele deixa como herança para os anos que vêm pela frente, com a carga pesada que preanunciam.
          De fato, o ano de 2011 pareceu mais destinado a anotar compromissos na agenda, do que a cumpri-los.
          Basta ver alguns deles, agendados para o Brasil.
          De imediato, no mês de junho de 2012, a “Rio+20”, o novo encontro das Nações Unidas sobres os desafios ambientais, na seqüência da “Eco 92”, de vinte anos atrás.
          Para 2013, desta vez em julho, o encontro mundial da juventude,no Rio de Janeiro, evento que já cunhou a imagem de uma juventude que quer retomar o seu protagonismo, resgatando valores que nunca perdem sua importância.
         Depois, 2014 será o ano da copa do mundo, que para nós é simplesmente a de futebol . Ela foi imaginada como uma espécie de convite geral a todos os países do mundo para virem, e verem, como está o nosso Brasil. O que iremos mostrar, e o que ficará escondido?
          Para o Rio de Janeiro, a ladainha de eventos continua, com o compromisso de acolher ainda os jogos olímpicos.
          Tudo somado, quantos compromissos colocados na conta de outros anos, enquanto o 2011 se despede. Ele também se deparou com diversos eventos, mas a grande maioria deles, ainda inconclusos, aguardando um desfecho definitivo. Para conferir, basta recordar alguns.
          O ocidente insuflou tanto a guerra civil na Líbia, até conseguir que Kadafi fosse morto. E agora, a que serviu derramar tanto sangue? Quais eram os interesses de tantas partes envolvidas?
          As populações árabes surpreenderam com suas manifestações massivas, clamando por mudanças, sacudindo arcaísmos, postulando abertura para valores da modernidade. E o que resultou de prático até agora?
          Bin Laden foi morto, numa cena de descarada vingança, que nos entristece como raça humana. Será que serviu alguma coisa para diminuir o ódio que fomenta radicalismos cegos e impiedosos?
          O Papa declarou abertamente sua decepção com a crise de fé que atinge especialmente o continente europeu, onde o cristianismo plasmou a primeira civilização com sua marca registrada . Será que estamos acertando as providências para estancar esta hemorragia que ameaça debilitar ainda mais a “cultura cristã”?
         Mas sobretudo no ano 2011 irrompeu de novo, com virulência multiplicada, a crise que se abate sobre a Europa, que já causou estragos em todo o “primeiro mundo”, e que mostra ser muito mais profunda do que uma simples crise econômica. Na verdade, ela é uma crise de civilização, de um sistema que está mostrando seu esgotamento. Repensar um novo projeto de civilização não é tarefa simples, nem de um ano só. Provavelmente, as mudanças mais significativas e mais profundas só serão tomadas sob forte pressão dos fatos, como é de praxe acontecer na história.
          Mas de uma coisa não podemos duvidar: a crise vai bater à porta do Brasil. Por enquanto, ainda temos algumas receitas tradicionais, que neutralizam os seus sintomas. Não vai demorar muito para nos depararmos com suas causas mais profundas e estruturais.
           Aí fica a pergunta, nada indiscreta: quem vai pagar a conta das mudanças a serem feitas? Certamente não dá para fazer como em outros tempos: capitalizar os lucros e socializar os prejuízos!
          No acerto das contas, o primeiro critério é a justa proporcionalidade. Em todo o caso, é bom começar o novo ano o alerta bem ligado!



A CNBB E O BRASIL


Dom Edvaldo G. Amaral SDB (*)


 A conhecida sigla CNBB designa “Conferência Nacional dos Bispos do Brasil” que, conforme o seu estatuto canônico, “congrega os Bispos da Igreja Católica no país (...) para melhor promover a vida eclesial (art. 1º).” A Conferência, diz o Direito Canônico (cânon 455) pode baixar decretos gerais, que obrigam a todos os bispos membros, em três casos: ou quando recebe para isso mandato especial da Santa Sé (Roma), ou quando é a pedido da própria Conferência ou quando o direito canônico delega esse poder a cada Conferência nacional. E há no direito algumas determinações que cada Conferência deve fixar, com força de lei, conforme os costumes do país, tais como: o traje clerical, as festas de preceito, o rito da celebração dos sacramentos, a aprovação dos livros litúrgicos na língua do país e semelhantes. Fora desses casos, bem definidos pelo direito, cada Bispo diocesano responde por seus atos no pastoreio da diocese unicamente à Sé Apostólica (Roma). E qualquer decreto, fora dos três casos previstos pelo direito, mesmo aprovado em assembléia geral, deixa livre cada bispo diocesano no exercício de seu múnus pastoral.

          Isso não quer dizer que a Conferência dos Bispos não preste precioso e imprescindível serviço às dioceses, sobretudo às mais carentes, que na sua ação pastoral contam com seu apoio e subsídios. Mas a Conferência dos Bispos é sobretudo o órgão da união do episcopado e se apresenta diante do país e do povo como expressão concreta da colegialidade episcopal.

          A nossa CNBB certamente representou a voz do povo durante o regime militar e defendeu como pôde os oprimidos e injustiçados, as vítimas das torturas e dos porões policiais. Já no governo de Fernando Henrique Cardoso, o presidente que endireitou o Brasil e resolveu o caos econômico em que vivíamos, a CNBB combatia muito o chamado “neo-liberalismo” e exultou com a ascensão à Presidência de seu sucessor.

          Agora, no regime de sua afilhada, que parece está mostrando a que veio, o boletim semanal da CNBB de 10 de dezembro, nº 48, traz em primeira página a manchete CNBB PUBLICA NOTAS OFICIAIS DE ALERTA SOBRE FATOS E REALIDADES PREOCUPANTES NO BRASIL.

          As notas são: 1) sobre indígenas, na defesa de seus direitos constitucionais para demarcação e homologação de suas terras ancestrais (que são maiores de que muitos estados brasileiros); 2) sobre o tratamento, no repasse de verbas às sociedades civis, de cujo tratamento a CNBB se queixa de que não podem ser igualadas a outras, aquelas “que são o rosto de nossa Igreja”; (acho difícil para um estado laico tratar diferentemente organizações sociais com rosto de qualquer igreja); 3) uso indevido de termos fora da Igreja católica como, “bispo”, “vigário”, “paróquia”, “padre”, “frei” etc – disse o presidente, Cardeal Damasceno, que tal uso confunde nossos fiéis menos informados; a 4ª nota expressa preocupação sobre o projeto do Código Florestal que, diz a CNBB, “não representa equilíbrio entre conservação e produção, mas uma clara opção por um modelo de desenvolvimento que desrespeita limites da ação humana”.

          Infelizmente, não faltará mais uma vez, na mídia nacional, quem negue à CNBB competência para se pronunciar sobre alguns desses assuntos...


(*) É arcebispo emérito de Maceió.

NATIVIDADE DE N. Sr. JESUS CRISTO


Dom Sebastião Armando Gameleira Soares *
sgameleira@gmail.com

Nasce Jesus, brilha a Glória de Deus

O convite é para meditar na profecia de Zacarias. A palavra-chave está no v. 12: “A Glória me enviou”. Justamente a glória de Deus se revela quando quem está humilhado, oprimido, reduzido à servidão, escravizado, recebe o anúncio de libertação. Quem estava disperso, enfraquecido, finalmente se reúne e, assim, se fortalece. A continuação do texto vai dizer que a grande revelação é que Deus vem habitar no meio de Seu povo (v.14). O anúncio da libertação é palavra gloriosa, divina, cheia de luz como Deus mesmo é. Pode acontecer conosco de novo o que antigamente se deu com o povo de Deus libertado de seus opressores do império da Babilônia. Outros impérios podem cair na história. Qual a razão de Deus insistentemente, através de seus profetas, manifestar o desagrado pela opressão e anunciar outra possibilidade para o povo? O texto tem uma frase preciosa: “Quem toca em vós, toca na menina de meu olho” (v.13). Toda a Bíblia, no Primeiro e no Novo Testamento, dá testemunho do amor e da opção de Deus pelos pobres, oprimidos e humilhados. Neles a criação está degradada. O Natal é a prova cabal: o Filho de Deus, Jesus, nasce entre os pobres, entre aqueles para os quais “não há lugar”... São os pobres que levantam diante de toda a sociedade a denúncia viva do desamor e o apelo a converter-nos a amar. É justamente este o tema da 1 Jo 4:7-16: a prática do amor é o critério para saber se somos de Cristo.


* Bispo da Diocese Anglicana do Recife – DAR
www.dar.ieab.org.br

ENTRE ALEGRIAS E TRISTEZAS, LÁ SE VAI MAIS UM ANO


Edilberto Sena *


O relatório do tempo que passou em 2011 dá um variado balanço para muitas pessoas. Como é natural, houve alegrias e tristezas, generosidades e traições, amores iniciados e amores perdidos, inverno prolongado e verão mais quente do que o normal. Assim por diante, para uns houve mais dores, para outros, mais alegria e agora o ano chega ao fim. Quem sofreu bastante, certamente quer esquecer o quanto antes e alimenta esperança de alegrias e vitórias para o próximo ano, que vem chegando. Mas o relógio do tempo não segue no mesmo ritmo do relógio de pulso ou de parede, nem obedece ao calendário gregoriano, que tem semanas, domingos e feriados. O relógio do tempo tem sua dinâmica própria, não segue a caprichos de reis nem de ditadores. Há quem diga que o tempo é a gente que faz, mas isso tem sentido no aproveitamento dos momentos que a vida oferece. Não tem sentido alguém dizer – não tenho tempo, quando não pode ou não quer assumir um compromisso.

Ninguém é dono do tempo, que é soberano. Mas todos podem aproveitar o momento presente, que é parte do tempo e aí, criar situações positivas, solidárias, amorosas e construtivas. Desta forma, o tempo que não tem ontem, nem amanhã, tem sempre o momento presente, que não se deve desperdiçar. O que será amanhã e o próximo ano não se sabe, embora se possa imaginar. Será melhor do que o ano que termina daqui a pouco? Quem sabe? Tudo vai depender de vários fatores, das opções que cada pessoa tomar, do que as autoridades farão de sua responsabilidade com o bem comum, de como os outros se comportarão diante da gente. Todos esperam o melhor, mas o que é o melhor? É estar de bem com a vida, consigo e com os outros. As crianças são um belo exemplo de como encarar a vida e o tempo. Elas não se preocupam com o amanhã, nem lamentam coisas ruins do passado. São felizes no presente, se lhes atendem as necessidades básicas de alimento, saúde e carinho. Elas sabem o que é bem viver. Olhando para as crianças a gente pode bem encerrar o ano sem lamentar dissabores que tenham ocorrido nos meses passados, que não existem mais. Mesmo que tenham ficado cicatrizes, elas curam e fazem parte da sua história. Também não é sadio criar grandes expectativas para o ano que vem, se ele ainda não veio. Criar grandes desejos pode dar grandes decepções. Infelizes os que fazem filas para comprar o bilhete da loteria da virada, que promete milhões. Milhões serão certamente os frustrados que não ganharão o bilhete da ilusão. Em vez de desejar Feliz Ano Novo, vale mais desejar Bem Viver a cada momento que chega.


* Pároco diocesano e coordenador da Rádio Rural AM de Santarém.


ENTRE PAPAI-NOEL E MENINO JESUS


Frei Betto *


     Da última vez que visitei Oslo, reuniam-se na capital norueguesa ministros do turismo de países escandinavos e bálticos para decidir: qual é a terra de Papai-noel?

     Ministros da Noruega, Dinamarca, Suécia, Finlândia e Islândia quebravam a cabeça para decidir como evitar propaganda enganosa junto ao público infantil. A criançada queixava-se: alguém mentia. Papai-noel não pode ter nascido - como sugeria a concorrência entre agências de turismo - na Lapônia e na Groenlândia, lugares distintos e distantes um do outro.

     Não conheço o resultado da conferência de Oslo. Espero que, se não chegaram a um acordo, pelos menos a guerra, se vier, seja apenas de travesseiros. Mas é a Finlândia que melhor explora a figura do velho presenteador transportado no trenó puxado por renas. Assinala inclusive a sua terra natal: Rovaniemi, onde o Santa Park é, todo ele, tematizado por Papai-noel, lá denominado Santa Claus.

     Sabemos todos que Papai-noel nasce, de fato, na fantasia das crianças. Acreditei nele até o dia em que me perguntei por que o Paulo, filho da empregada, não recebera tantos presentes de Natal como eu. O velhinho barbudo discrima os pobres?

     Malgrado tais incongruências, Papai-noel é uma figura lendária, reaviva a criança que trazemos em nós. E disputa a cena com o Menino Jesus, cujo aniversário é o motivo de festa e feriado de 25 de dezembro. Papai-noel enriquece os correios no período natalino, tantas as cartas que são remetidas a ele. Aliás, basta ir aos Correios e solicitar uma das cartas que crianças remetem ao velhinho barbudo. Com certeza o leitor fará a alegria de uma criança carente.

     Não se sabe o dia exato em que Jesus nasceu. Supõem alguns estudiosos que em agosto, talvez no dia 7, entre os anos 6 ou 7 antes de Cristo. Sabe-se que morreu assassinado na cruz no ano 30. Portanto, com a idade de 36 ou 37 anos, e não 33, como se crê.

     Tudo porque o monge Dionísio, que no século 6 calculou a era cristã, errou na data do nascimento de Cristo.

     Até o século 3, o nascimento de Jesus era celebrado a 6 de janeiro. No século seguinte mudou, em muitos países, para 25 de dezembro, dia do solstício de inverno no hemisfério Norte, segundo o calendário juliano. Evocavam-se as festas de épocas remotas em homenagem à ressurreição das divindades solares.

     Os cristãos apropriaram-se da data e rebatizaram a festa, para comemorar o nascimento Daquele que é "a luz do mundo". Para não ficar de fora da festa, os não cristãos paganizaram o evento através da figura de Papai-noel, mais adequado aos interesses comerciais que marcam a data.

     Vivemos hoje num mundo desencantado, porém ansioso de reencantamento. Carecemos de alegorias, mitos, lendas, paradigmas e crenças. O Natal é das raras ocasiões do ano em que nos damos o direito de trocar a razão pela fantasia, o trabalho pela festa, a avareza pela generosidade, centrados na comensalidade e no fervor religioso.

     Pouco importa o lugar em que nasceu Papai-noel. Importa é que o Menino Jesus faça, de novo, presépio em nosso coração, impregnando-o de alegria e amor. Caso contrário, corremos o risco de reduzir o Natal à efusiva mercantilização patrocinada por Papai-noel. Isso é particularmente danoso para a (de)formação religiosa das crianças filhas de famílias cristãs, educadas sem referências bíblicas e práticas espirituais.

     Lojas não saciam a nossa sede de Absoluto. Há que empreender uma viagem ao mais íntimo de si mesmo, para encontrar um Outro que nos habita. Esta é, com certeza, uma aventura bem mais fascinante do que ir até a Lapônia.

     Contudo, as duas viagens custam caro. Uma, uns tantos dólares. Outra, a coragem de virar-se pelo avesso e despir-se de todo peso que nos impede de voar nas asas do Espírito.
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*Frei Betto é escritor, autor do romance Um homem chamado Jesus (Rocco), entre outros livros. http://www.freibetto.org/
 twitter:@freibetto.


Copyright 2011 – FREI BETTO – Não é permitida a reprodução deste artigo em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização do autor. Se desejar, faça uma assinatura de todos os artigos do escritor. Contato – MHPAL – Agência Literária (mhpal@terra.com.br)


MARIA DE NAZARÉ


Ivone Gebara *


É hora de redescobrir o verdadeiro
rosto de Maria de Nazaré e ser, a
exemplo dela, capaz de gerar no
mundo a salvação, pela
misericórdia, justiça, partilha e
pelo respeito à vida.

São 6 horas da tarde. Apesar da agitação da cidade e da música barulhenta, comum na maioria das emissoras, algumas rádios em diferentes lugares do País ainda tocam a tradicional Ave-maria. Há uma mistura de sentimentos que atravessam os corações dos ouvintes. A maioria deles provavelmente nada tem a ver com a vida de Maria.

É como se essa música ao entardecer despertasse em nós uma misteriosa saudade súbita que brota do mais fundo de nós mesmos, misturada a lembranças vagas e imprecisas; recordações que passam rápido de um evento a outro. São lembranças de paz, de ternura, de compreensão, que afloram talvez com a saudade da Maria de nossa infância e de nossa vida, que chamamos de Nossa Senhora, vestida de branco, com manto azul, carregando um menino nos braços e trazendo com ele nossos sonhos, segredos e esperanças.

O momento da música é passageiro - apenas alguns minutos de pausa benfazeja, que nos introduzem numa espécie de parênteses cheio de sentido, até voltarmos novamente à atividade cotidiana.

Podemos prolongar o momento bom da música de outro jeito, refletindo sobre aspectos que são além de nossos sentimentos, das diferentes imagens de Nossa Senhora e dos vários nomes que recebeu ao longo da tradição da Igreja.

Convido os leitores a tentar encontrar o rosto de Maria, a Maria de Nazaré, aquela que está na base de nossas devoções e de nossa fé. Isso não significa que conseguiremos retraçar sua vida histórica com fidelidade. A poeira dos séculos torna esta tarefa quase impossível. O que conseguimos é apenas situá-la como pessoa, como mulher de carne e osso como nós. E isso já é muito.

Aproximar-se de Maria como pessoa é devolver-lhe seu rosto humano, suas possibilidades e qualidades humanas, sua realidade histórica e, ao mesmo tempo, é como se nós também nos humanizássemos mais e nos tornássemos mais responsáveis uns pêlos outros.

As pessoas que têm filhos se alegram quando estes chegam à maturidade e se tornam capazes de se responsabilizar por sua vida e pela vida dos irmãos. Tornam-se então adultos, capazes de amar, de buscar caminhos de justiça e misericórdia. Sabemos que toda dependência excessiva diminui a pessoa humana. Se alguém espera tudo de alguém, há algo que não está muito bem nessa relação. A atitude de quem joga sempre a responsabilidade de seus atos sobre os outros denota um significativo grau de imaturidade.

O mesmo acontece com nossa relação com Maria, quando não descobrimos o seu rosto humano. Apesar dos ensinamentos que a distanciaram de nós, ela foi e é pessoa. Não podemos fazer dela uma deusa toda poderosa distante da vida cotidiana, uma deusa cuja imagem é facilmente manipulável pêlos poderosos deste mundo.

Sabemos que houve chefes de Estado, inclusive na América Latina, que nomearam Nossa Senhora como comandante de seus exércitos, os quais serviram para reprimir e tirar a vida de muita gente. Evidentemente essa Nossa Senhora comandante de exército não é a Maria de Nazaré, uma mulher que abraçou os ideais de liberdade de seu povo - ideais de partilha e misericórdia que São Lucas exprime tão bem no magnificat (Lc 1,46 a 55).

Ávida nos desafia a contemplar o verdadeiro rosto de Maria de Nazaré, anterior a todas as histórias de aparições de Nossa Senhora. As aparições devem ser situadas na tradição religiosa de um povo, sempre envoltas de muita complexidade. A atitude de respeito é a mais indicada no que se refere à diversidade dessas aparições. Não podemos parar nas discussões sobre sua veracidade ou não, mas ir em busca do verdadeiro rosto de Maria, que os Evangelhos e a memória histórica podem nos ajudar a recuperar.

Contemplar o rosto primitivo de Maria nos faz amá-la de outro jeito, isto é, através do amor aos irmãos. Ela passa a ser para nós símbolo do amor que temos uns pêlos outros capaz de gerar relações mais fraternas entre nós. Dessa forma, saímos da relação de dependência infantil, da situação de pedintes que esperam tudo de sua senhora, para uma relação igualitária, em que de certa forma nós nos tornamos Maria uns para os outros. Isto significa que passamos a nos comportar como pessoas capazes de gerar o divino no humano, capazes de gerar, em nossa carne, aquele Jesus que não calou sua voz para denunciar injustiças, que se abriu aos marginalizados, que viveu a ternura e a misericórdia no cotidiano da vida.

Essa perspectiva modifica nossa relação com Maria e até nossa oração. Nesse sentido, quando rezamos a ave-maria, nós nos incluímos nessa oração. Somos cheios da graça do Espírito, capazes de dar frutos benditos e de gerar justiça, bem, perdão, compreensão, partilha e amor.

A ave-maria se torna mais do que uma reza ou uma devoção: transforma-se numa oração que nos compromete a ser como Maria é, segundo nossos lábios dizem. Passa a ser uma proposta de modificação de nossa vida, que nos obriga a ações concretas no sentido de melhorar o mundo e nossas relações. Por isso, as pessoas que rezam o terço deveriam se esforçar por fazê-lo como um ato de consciência de sua própria vida.

Assim, tornariam seu coração não só repleto da presença dos sofrimentos e alegrias de Maria, mas também dos sofrimentos e alegrias de nosso povo, das pessoas próximas ou mais distantes, que carregam os pesados fardos do cotidiano. Essa oração feita como ato de consciência deveria nos levar ao compromisso de ajudar a suprimir as injustiças que estão em nosso meio e a crescer em sensibilidade e solidariedade humana.

Os chamados mistérios da vida de Maria são também os mistérios da vida do povo - nossos mistérios de sofrimento, de gozo e de alegria.

À medida que aproximamos Maria de sua realidade profundamente humana, estamos fazendo justiça a ela.

E Maria de Nazaré que nos ajudará a entender as devoções que os séculos de cristandade lhe fizeram e as histórias que dela contaram. É ela que vai nos dizer que, para além de cada aparição - Fátima, Lourdes, Salete, Carmo - e de cada nome - Aparecida, Conceição, das Graças, dos Anjos, do Perpétuo Socorro -, existe uma pessoa com um rosto parecido com o nosso que levou uma vida tentando ser ela mesma repleta do Espírito Santo e ajudando outras pessoas a serem igualmente habitações do Espírito. Ser moradia do Espírito é o convite que Maria de Nazaré nos faz. Não é fácil de ser aceito, mas é um caminho para a felicidade dos que crêem que o dom da vida é dado em abundância para toda a humanidade.

E triste ver que nossa sociedade esquece o direito à vida entregue misteriosamente como dom a todas as pessoas. Nossa sociedade exclui homens, mulheres e crianças dos bens a que têm direito, impondo a lei do mais forte, a competição desenfreada, a morte camuflada, o lucro como deus.

E o lucro é um deus terrível, sedento de si mesmo, que beneficia poucos, conservando-os em tronos de ouro, enquanto a maioria se alimenta com migalhas, tentando sobreviver com os restos dos banquetes idolátricos. Este ídolo engole vidas sem se preocupar com seu valor. E ele, infelizmente, tem sido a divindade de nossa sociedade. É preciso colocá-lo no seu devido lugar para que nossa vida seja respeitada.

São 6 horas da tarde... É de novo a hora da Ave-maria. É hora de despertar para a Maria de Nazaré que dorme em nós. Precisamos nos dar as mãos para sermos coletivamente Maria, habitação do Espírito, cheia de graça, força e vigor, capaz de gerar no mundo a salvação pela misericórdia, pela justiça, pela partilha e pelo respeito à vida de cada um. Juntos poderemos repetir, então, de forma nova e com convicção: "Eis-nos aqui, servidores do Espírito que é vida. Faça-se em nós a sua Palavra". Amém.

"Agiu com a força do seu braço,
dispersou os homens de coração
orgulhoso. Depôs poderosos
de seus tronos, e a humildes exaltou."
(Cântico de Mana - Lc l ,51 -52)


* Filósofa e teóloga, feminista e escritora


CIÊNCIA E ÉTICA


Leo Pessini*


Ciência e ética são áreas complementares do conhecimento humano e, por isso, não devem ter posturas antagônicas entre si. Acima de ambas deve estar o respeito pela dignidade do ser humano e a melhoria da qualidade de vida.
A humanidade está inquieta com as inúmeras possibilidades de manipulação do ser humano, que nascem a partir das novas descobertas no campo da genética. Necessitamos de uma ética da proteção. Para além do conhecimento científico, urge que cultivemos sabedoria ética, a fim de proteger o indivíduo – este universo singular que traz em seus genes a história da humanidade.


*Camiliano, pós graduado em Clinical Pastoral Education pelo S. Lukes's Medical Center (Milwaukee, EUA). Professor doutor no programa de mestrado em Bioética do Centro Universitário São Camilo (SP) e autor de inúmeras obras na área da bioética, dentre as quais Bioética: um grito por dignidade de viver e co-organizador de Buscar sentido e plenitude de vida: bioética, saúde e espiritualidade.

ASAS DO TEMPO, O TEMPO URGE


Lila Costa


          Para nós parece que foi ontem, mas já faz 01 ano. Um ano de saudade, de ausência, de lembranças. Mesmo tendo curtido muitos momentos juntos, sempre fica algo que não foi dito, deixamos para depois, pois consciente ou inconscientemente achamos que temos muito tempo pela frente. O nosso tempo é muito curto, ele voa, é o aqui e o agora, passou perdemos a chance. O outro momento, é outro momento, com as suas novidades e vamos vivendo aquele turbilhão.

          Aí vem o tempo e dá aquela parada e não dá mais tempo para nada e não temos mais tempo presente nem futuro, só passado, aí nos lembramos do quanto deixamos de fazer, de falar e de ser. Por mais que tenhamos feito, dito ou sido, tínhamos muito mais.

          Viver é um constante aprendizado, então aproveitemos todos os acontecimentos bons ou ruins e procuremos ser melhores a partir deles.

          É provável que nunca vamos fazer o bastante, por que quando queremos bem, o melhor nunca é o suficiente. E quando perdemos o nosso bem querer aí é que parece insignificante tudo o que fizemos.

          Então como dizia o poeta vivamos como se não houvesse amanhã. Vivamos intensamente hoje, se houver amanhã aproveitaremos novamente, porque quando as saudades chegarem, os sofrimentos serão menores, pois as lembranças boas são maiores do que as ruins e as nossas saudades doerão menos.

          É bom termos sempre em mente, que tudo passa muito rápido, o tempo urge, o tempo voa. Então vivamos cada dia como se fosse o último, de preferência da melhor forma, fazendo o bem e nos amando uns aos outros, sem levar em consideração os defeitos, pois estes todos os temos. Assim valorizemos as virtudes pois são estas que prevalecem quando a saudade se torna presente.

          Esta é a lição que tiramos com a falta que Heber nos faz.


TEXTO DE LUG COSTA



(Re)começamos um novo ano

mais próximos de lá estamos chegando.

Alguns já ficaram no ano velho

retidos em seus leitos esperando o amanhecer.

Outros acordaram no meio da noite

sonhando com outras possibilidades

para superar os próprios limites.



(Re)começamos um novo ano

cheios de recordações passadas,

e entre saudades e expectativas

estamos dispostos a (re)começar a luta.

(01.01.2010 – 07:50h – Caxias/MA)


CONTEMPLAÇÃO

Malu Nogueira
(alines.veras@hotmail.com)


Um passo ao longe,
na tarde envolvida num frio abissal.
Acompanha a folha seca levada
pelo vento para além do monte.
Um pássaro rasga o silêncio reinante,
Outros passos repetem-se
E se distanciam sobre as pedras do caminho.
Miséria não se vê sob os bancos desnudos,
Desprezados por viventes escondidos
Em pesados abrigos bem-feitos.
O que fica é a visão perfeita,
Que investiga, sem arrependimento,
a quietude apática, que afugenta
a caminhada dos passantes,
aclimatados para o frio intenso,
estrangulando a voz presa,
Que se queda, em viva tristeza,
Para à tarde que se esvai insensível.



TEMPO DE COOPERATIVISMO / PARA UM ANO NOVO MAIS FELIZ


Marcelo Barros(*)


“Considerando que as cooperativas, em suas diferentes formas, promovem a maior participação possível de todas as pessoas no desenvolvimento econômico e social, assim como são cada vez mais um  de progresso e podem ser de grande contribuição para a erradicação da pobreza, a 65ª assembléia geral da ONU proclama o ano de 2012 como ano internacional das cooperativas”.

          Quando a ONU decidiu isso, em 2009, o mundo já vivia a atual crise econômica, ecológica e de civilização. Essa crise foi agravada porque a maioria dos governos quer resolver a crise usando como remédio o mesmo veneno que a provocou: o capitalismo neoliberal. Sem dúvida, diante desse fracasso de governos ricos, a ONU percebe que a economia é um assunto sério demais para que o deixemos somente nas mãos de tecnocratas e políticos pouco comprometidos com a vida de todos. Mesmo se as responsabilidades são diversas e os governos têm uma função essencial na condução dessa realidade, é urgente que todos os cidadãos assumam sua responsabilidade diante do futuro da sociedade e mesmo da vida no planeta. Essa responsabilidade deve nos levar a escolher representantes comprometidos com as melhores causas da humanidade, assim como pede que nós mesmos assumamos nossa parte nessa construção de um mundo novo e mais justo com os empobrecidos do mundo y com a natureza. Uma forma de viver uma economia mais solidária e comunitária é através das cooperativas que ousam se construir a partir das bases e de uma forma mais socialista. Graças a Deus, na América Latina, governos mais ligados às comunidades carentes e empobrecidas, têm favorecido essas cooperativas, sejam de lavradores responsáveis pela agricultura familiar e pela produção de alimentos saudáveis, sejam mesmo nas cidades, onde, como no Brasil e na Argentina, algumas indústrias antes em falência foram assumidas pelos operários em regime de cooperativa.

          Nesse Natal, a presidenta Dilma, continuando um gesto de Lula durante todos os seus oito anos de governo, se deslocou do planalto e foi a São Paulo para participar da celebração de Natal com a associação dos sofredores de rua e catadores de material reciclado na cidade. Ali em meio a famílias pobres e pessoas egressas da rua percebeu o valor da cooperativa de catadores e como essa faz da reciclagem fonte de renda e de vida digna para muita gente.

          Quando no mundo antigo, o termo Igreja foi usado pelas primeiras vezes, seu sentido era de cooperativa de cidadãos. O termo grego ekkesia queria dizer assembléia de cidadãos, mas também associações de trabalhadores. Por isso, como uma lei imperial (A Lei Júlia) proibia cooperativas sociais, o Império Romano considerou as Igrejas cristãs como associações ilegais. O termo comunhão (em grego Koinonia), tão central na fé cristã, pode ser traduzido por participação ou por cooperativa. Esse é o projeto divino para toda humanidade: viver como irmãos/ãs e companheiros/as em uma única cooperativa, a comunidade da vida.

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PARA UM ANO NOVO MAIS FELIZ



          O desejo é uma palavra mágica. Quando desejamos com força interior, emitimos uma energia misteriosa que nos impulsiona para o compromisso de realizarmos aquilo que desejamos. Isso pode ter conseqüências concretas para as pessoas e para o mundo. Nesses dias, há quem diga aos amigos e amigas “feliz ano novo” como mera formalidade. Entretanto, o mundo e nosso continente necessitam muito de que 2012 seja um ano mais feliz e de paz para cada um de nós e para nossa pátria grande. Por isso, quem almeja de coração os melhores votos de ano novo precisa saber como transformar o seu desejo em caminho positivo que construa um futuro novo e melhor.

          Quando eu era menino, as pessoas acreditavam muito no poder do olhar. Diziam que existe o olhar bom que emite energia positiva e existe o mau olhado que provoca problemas. As vizinhas gostavam de contar histórias de uma visita que receberam. A mulher gostou da planta ornamental que havia no terraço da casa. Olhou-a com inveja. No dia seguinte, a planta que estava viçosa e florescente, amanheceu seca e murcha. As antigas culturas e religiões crêem na força da palavra. Em algumas religiões, as palavras curam ou, ao contrário, podem matar. Na Bíblia, vários salmos pedem a Deus que nos proteja das pessoas que, com sua palavra, podem provocar males como doenças e tragédias ecológicas (Cf. Sl 6, 39, etc). Essa cultura de pessoas que amaldiçoam vinha de Sumer, onde havia rituais de Shurpu, maldições comuns em algumas culturas populares que não tinham outra força além da palavra. No tempo da escravidão, um senhor de engenho mandava dizer a um escravo que, naquela noite mandasse a sua filha de menor idade à casa grande. O negro já sabia quais as intenções do senhor. Ele não tinha outro recurso do que a ameaça de uma maldição, principalmente se o senhor acreditasse que o despacho lhe faria mal. De fato, a própria Bíblia diz que a maldição de um empobrecido é ouvida e atendida por Deus (Cf. Eclo 4, 6). No Novo Testamento, a carta de Pedro insiste que temos a vocação de abençoar e não de maldizer. Somos chamados para invocar o bem sobre as pessoas e o universo (1 Pd 3, 9).

          A palavra é eficaz quando nasce no mais profundo do coração e é precedida pela prática da vida. A Bíblia diz que é como uma espada de dois gumes que penetra até as entranhas (Hb 4). Isaías compara a palavra de Deus com a chuva que cai, molha a terra. E não volta ao céu sem ter cumprido sua missão de fecundar e produzir o grão (Is 55). O Mahatma Gandhi ensinava: “Comece por você mesmo a mudança que deseja para o mundo”. Somente pelo fato de desejar, não temos a força para transformar organizações e sistemas do mundo, mas podemos sim colaborar para que se façam as condições necessárias para que elas mudem. Então, que você expresse para os seus e para todos o desejo de um feliz ano novo, através de um verdadeiro compromisso social, solidário e renovador. Então se tornarão verdadeiras em sua vida, as palavras de uma antiga bênção irlandesa: “O vento sopre suave em teus ombros. Que o sol brilhe suavemente sobre o teu rosto, as chuvas caiam serenas onde vives. E até que eu te encontre de novo, Deus te guarde na palma de sua mão”.


(*) Monge beneditino, teólogo e escritor.


CURTINDO O ANO NOVO


Maria Clara Lucchetti Bingemer,
professora do Departamento de Teologia da PUC-Rio *


As balsas já começaram a ser montadas, os shows erguem os palanques, os corações e sobretudo as gargantas e estômagos se preparam. Nem bem acabou o Natal, o Ano Novo já se anuncia pelos preparativos, o clima que paira no ar, a sintonia das pessoas que substituíram Papai-Noel pelos fogos de artifício que rasgarão os céus durante vários minutos com a chegada de 2012.

E já na manhã do dia 1º de janeiro o comércio começará a encher as vitrines com produtos de Carnaval, pois os blocos e festas pré-carnavalescas começarão a acontecer antes dos três dias de Momo. E na Quarta-Feira de Cinzas ovos de chocolate brilharão sedutores, convidando ao consumo e ao sabor. E, assim, sucessivamente chegarão o Dia das Mães, o Dia dos Namorados, o Dia dos Pais, o Dia da Criança e todas as datas que o comércio festeja e das quais vive até que...de novo será Natal e nem percebemos.

Enquanto na Antiguidade o tempo era marcado pela semeadura e a colheita, e na Idade Média pelas festas religiosas, em nossa sociedade pós-moderna o tempo é marcado pelas datas estelares do consumo. E como é importante não deixar cair o ritmo, já que o consumo não pode perder a velocidade sob pena de perder o poder de sedução sobre as pessoas, a rapidez e a efemeridade são uma marca registrada de nosso modo de contar o tempo.

Vivemos apressadamente, pulando de uma etapa para outra, de uma festa para outra, de uma comemoração para outra. Não se celebra mais, comemora-se. Não se fazem mais ritos de passagem, mas sim saltos de mudança atropelados e sem preparação. Não se vive mais em profundidade, se é carregado pela vida, que não deixa tempo sobretudo para se pensar e refletir. Há que viver em ritmo de frenesi, de pressa, de sucessão vertiginosa, de emoções provocadas e rasas.

A fisionomia da pessoas durante o tempo que precede o Natal se transforma; estão ansiosas, apressadas, cansadas, esgotadas. Reclamam da centena de compromissos, dos milhares de almoços de “confraternização”, dos “amigos ocultos” em profusão, dos festejos vazios e sem finalidade. Nada cala fundo, nada convida a uma reflexão, nada marca um momento e faz suavemente a passagem para o outro.

Em 2012 a coisa promete repetir-se. Já há contagem de quantos feriados ponte haverá, em que época cairá o carnaval e como será possível emendar os dias para torná-lo mais longo. Assim como a Semana Santa, que santa para muitos deixou de ser há longo tempo, tornando-se apenas um feriado a mais, quando se bebe, se come, se dorme em demasia para depois cair na mesma rotina sem transformação interior, sem conversão, sem passagem pascal da morte para a vida verdadeira.

E, no entanto, depende de nós. Depende de nós andar na contramão dessa corrente que nos arrasta inexoravelmente. Depende de nós fazer com que o Ano Novo seja diferente. Depende de nós viver intensa e profundamente cada momento, não como um foguete que passa, do qual só vemos a cauda, mas deixando-nos moldar e configurar por ele. Depende de nós sermos senhores e não escravos do tempo que o calendário comercial nos determina. Depende de nós fazermos a pauta do Ano que começará em poucos dias.

Neste Novo Ano, vivamos a vida e não deixemos que a vida nos viva. Amemos as pessoas sem data marcada. Não só no dia fixado para homenageá-la. Beijemos nossas mães todos os dias e não apenas no segundo domingo de maio. Festejemos nossas crianças a todo minuto e a todo momento, e não apenas no dia 12 de outubro. Vivamos o carnaval com alegria, sim, que a alegria e a festa são coisas boas e humanizadoras. Mas vivamos também a Quaresma que nos prepara para a grande luz da Páscoa, que nos diz que fomos feitos para a vida e não para a morte.

Demo-nos tempo, pois o tempo nos foi dado. Ao criar o mundo e criar-nos, o Criador nos fez históricos e cronológicos. Se não vivemos nossa condição de seres históricos, se não refletimos sobre cada acontecimento, não poderemos aprender as lições da história e crescer com erros e acertos. Se tudo passa muito rápido por nós, como água pelo espelho, sem interiorização nem absorção, corremos o risco de passar correndo pela vida e sermos surpreendidos pela morte, que só nos mostrará no espelho da verdade o imenso vazio do não vivido.

O ano vem novo e cheio de promessas. É preciso vivê-las e vê-las transformar-se em realizações. Ou serem adiadas na fé e na esperança. Curtir cada experiência e dela fazer aprendizado. Para que o ano continue novo, mesmo avançando em seus 365 dias. Pois na verdade...o que são 365 dias diante da eternidade? FELIZ ANO NOVO!


* Maria Clara Bingemer é autora de "A Argila e o espírito - ensaios sobre ética, mística e poética" (Ed. Garamond), entre outros livros.


Copyright 2011 – MARIA CLARA LUCCHETTI BINGEMER - É proibida a reprodução deste artigo em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização. Contato – MHPAL – Agência Literária (mhpal@terra.com.br)


CENAS DIÁRIAS


I – SEM DESVIO

Maria Inez do Espírito Santo


Humaitá, Rio de Janeiro, 2007.

Diariamente indo e vindo de casa até o trabalho, percorro dois quarteirões dos mais movimentados do bairro. No trajeto, a Cobal, um conglomerado de lojas de alimentos, restaurantes, com dois parques de estacionamento, lojas de roupas, de flores, de material fotográfico, de decoração, vídeo-locadora, salpicados ao redor, colorindo a região e trazendo aromas gostosos e outros tantos muito desagradáveis, ao mesmo tempo.

Como quase tudo no Rio de Janeiro, a Cobal é mal cuidada. Suja, não tem tempo suficiente para se refazer do desgaste intenso que sofre, atendendo ao público, que se reveza em solicitações múltiplas, de manhã até a madrugada. O odor acre que persiste no ar, mesmo após a “limpeza” diária, revela o não cumprimento das normas de higiene dos códigos de postura oficiais.

Não é incomum ver-se ratos rondando caixas de mercadorias ou perambulando entre os canteiros do pátio externo, em busca de alimentos. Por repugnante que seja, isso não chega a espantar a freguesia. Nem o lixo acumulado na rua ao lado, por onde os caminhões de abastecimento entram e saem, incomoda a ponto de provocar indignação que gere providências dos comerciantes.

Na verdade, “a gente se acostuma a tudo - como diz a Françoise Sagan - até com a dor”, embora eu concorde com Marina Colasanti, quando diz: “A gente se acostuma, mas não devia”.

Tendo a Cobal como portal do insólito, passemos para a segunda quadra. Há ali, naquela pequena região, duas escolas públicas, quatro escolas particulares, várias clínicas médicas, algumas clínicas de atendimento psicológico, pelo menos dois laboratórios clínicos, um grande centro de serviço municipal, diversos escritórios, dois centros budistas, dois centros culturais, uma escola de teatro, e é claro, alguns ambulantes e um lavador de carros que utiliza a calçada como oficina, tendo inclusive instalação de luz puxada de um poste da rua e criando ali uma lagoa permanente.

Pois, atualmente, tenho encontrado, todos os dias, nesse quarteirão, nos horários mais variados, perto de uma dezena de crianças e jovens, provavelmente moradores de rua, dormindo pelas calçadas, em situação de miséria e desamparo que ressaltam aos olhos mais distraídos. Estendidos no chão, cobertos por panos e enrolados uns nos outros como “bicho-de-monte”, parecem tão exaustos que resistem aos ruídos urbanos diurnos e mesmo ao passar constante dos transeuntes.

Para que as crianças circulem a caminho das escolas, precisam usar a rua, já que as calçadas se tornaram as camas dessas pessoas, seus sanitários, seu reduto.

Mesmo assim, nenhuma providência é tomada. É como se ninguém estivesse vendo o que de fato está acontecendo a nosso redor.

Fico pensando no que se ensina nessas escolas, o que se trata nessas clínicas, o que se prepara nesses escritórios e de como é possível conciliar os valores que alicerçam esses serviços, com o descaso e a impotência frente a um quadro tão flagrantemente denunciador da nossa doença social.

Na frente da Cobal, outros tantos meninos, mulheres com crianças e até homens adultos, cercam os passantes, pedindo ou exigindo esmolas e ajuda. Desses, a gente que passa, normalmente se esquiva, foge até. Cada dia maior o contingente, torna a ajuda individual impossível de surtir algum efeito bom.

Mas os que ali à frente estão adormecidos, desamparados e indefesos pelo sono, esses que já transformaram as calçadas em dormitórios, sanitários, quase covas, nos paralisam quando, ao contrário, tal situação deveria provocar em nós uma nova atitude.

Todos os dias, por isso mesmo, chego muito triste a meu trabalho. Por mais que acorde com o céu azul, por mais que queira recomeçar do zero cada etapa, me estristece confrontar-me com a miséria material de alguns de meus semelhantes e com a miséria moral que já se estende a todos nós, que pactuamos com isso.

Não falo aqui, é preciso deixar claro, de afastar de nossos olhos o quadro aflitivo, tirando daqui pra ali o que possa nos ser desagradável de ver. Falo de acordar, dentro de nós, nossa parte indigente, que já não tem mais vontade de mudança, que não tem mais desejo de viver. Acordá-la e cuidar bem dela, em primeiro lugar.

A partir daí será mais fácil nos unirmos, em busca de soluções (os que entre nós ainda não tiverem virado estátua de sal) para irmos ao encontro desses seres humanos, que aí estão, refletindo nosso próprio abandono.